terça-feira, 1 de julho de 2008

Sistema de saúde pode estar em risco dentro de cinco anos


(PÚBLICO) Em Linha 01.07.2008, Alexandra Campos
A qualidade do serviço prestado no sistema de saúde pode estar em risco. Se não se fizer nada entretanto, dentro de cinco anos poderemos ter um sistema de saúde que não responde às necessidades da população, alerta o Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) no seu relatório anual, que é oficialmente divulgado hoje em Lisboa.

O aviso é sério: o coordenador do observatório, Pedro Lopes Ferreira, fala mesmo na "necessidade urgente de uma discussão profunda, sob pena de dentro de cinco anos estarmos a viver num país com um sistema de saúde com má resposta aos legítimos interesses dos cidadãos". Aliás, é a primeira vez que o observatório, que faz balanços anuais sobre a evolução do sector desde 2001, utiliza a palavra riscos (sintomaticamente o documento intitula-se "Riscos e Incertezas"). O OPSS integra investigadores de várias instituições académicas dedicadas ao estudo dos sistemas de saúde.

Pedro Lopes Ferreira acredita, em última instância, que "é o futuro do serviço público que está em jogo". "Corremos o risco de ter um serviço público para os indigentes, como há alguns anos, enquanto a outra franja da população também não vai poder pagar muito", disse ao PÚBLICO.

Depois de termos atingido "níveis bons de saúde, níveis já aceitáveis de resposta, a geometria dos sectores públicos e privado está a agora alterar-se de forma significativa no país. A oferta privada é agora mais abundante, geralmente de maior qualidade", refere o relatório. Que lembra que, segundo o Instituto Nacional de Estatística, a produção privada em saúde já atingiu o valor de 30 por cento. E o problema é que, enquanto isto acontece, o "Estado mantém a sua distracção crónica por aspectos fundamentais de transparência e organização do sistema" e a prática governativa de saúde, em geral, "mantém-se ocupada na resolução de problemas pontuais", lamentam os membros do observatório. "A fuga de profissionais [para o privado] começa a ser assustadora", destaca o coordenador, sublinhando que estes já começam a ter acesso a tecnologia, formação e condições de trabalho que antes não encontravam neste sector. "Daqui a poucos anos não haverá recursos humanos para manter o serviço público de saúde", antevêem.

Consideram ainda que a actual ministra ficou com "uma herança mais pesada daquilo que à primeira vista" pode parecer. E voltam a apontar o dedo às taxas moderadoras de internamento e cirurgias e "à gestão pouco competente e socialmente insensível" nos encerramentos de maternidades e urgências.

Mas os membros do observatório não deixam também de destacar os aspectos positivos das políticas seguidas em determinadas áreas. Como a dos cuidados de saúde primários, com a criação das Unidades de Saúde Familiar, uma boa medida, apesar de o número continuar aquém das expectativas. De seguida, porém, questionam o conturbado processo de constituição dos Agrumentos de Centros de Saúde - os ACES que deveriam substituir substituir as sub-regiões de saúde. "Esta indefinição, esta situação híbrida acarreta riscos", teme Pedro Lopes Ferreira.O relatório destaca ainda outros avanços verificados em 2007 - como a nova lei do tabaco e a da interrupção voluntária da gravidez -, mas considera que a criação de um Alto Comissariado da Saúde, distinto da Direcção-Geral da Saúde, não passa de um "recuo estrutural", por ter originado "sobreposições indesejáveis".

Num outro capítulo, os investigadores põem em causa a fatia da despesa com o cancro em Portugal. O cancro representa "apenas seis por cento" da despesa global da saúde, apesar de esta patologia ter um peso bem mais significativo na sociedade (é responsável por 16 por cento dos dias de vida perdidos devido à doença (DALY), de acordo com um estudo que aguarda publicação). O impacto do cancro na sociedade excede assim largamente os recursos consumidos com o seu tratamento em Portugal, sublinha o documento, notando que não há sustentação para a tese do desperdício, nesta área, que tem circulado nos últimos tempos. Cancro representa só seis por cento da despesa global do Ministério da Saúde, liderado por Ana Jorge

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