Sem poderes ocultos, nem manipulaçõs, nem vitimações, o texto quase integral da "rogatória", vinda da fuga ao segredo de justiça, essa instituição nacional que já sujou. perseguiu, expulsou e até condenou judicialmente tanta gente, mas com que ninguém acaba, porque não quer, como se pode demonstrar... Caso para dizer, embora com amarguém, que se a justiça é igual para todos, entre nós, a fuga ao segredo de justiça também.
Os "factos" judiciais estão aqui. Não vale a pena dramatizar mais, nem para um lado nem para outro (PB).
Neste documento a que o DN teve acesso, o Serious Fraud Office pede assistência judicial a Portugal para uma investigação que está a decorrer feita por este gabinete e pela Polícia da Cidade de Londres. O SFO invoca a lei inglesa, nos termos da qual tem jurisdição para investigar e abrir acções judiciais para crimes suspeitos em Inglaterra, País de Gales e na Irlanda do Norte que possam alegadamente parecer fraude grave ou complexa. Perante a lei, o Serious Fraud Office pode pedir aos tribunais portugueses que recolham provas para uma investigação criminal. Segue-se a transcrição da Carta Rogatória, no que se refere aos factos que a justificam e aos pedidos feitos pela polícia inglesa.
Pessoas a ser investigadas:
A Serious Fraud Office e a Polícia da Cidade de Londres estão a fazer uma investigação por suspeita de crimes. Esta investigação está relacionada com uma outra feita pelas autoridades portuguesas sob suspeita de suborno e corrupção relacionadas com o Freeport de Alcochete.
Os cidadãos do Reino Unido que se sabe terem ligações ao caso e que estão por isso a ser investigados são os seguintes:
1- Sean Collidge 2- Garry Russel 3- Jonathan Rawnsley 4- Rick Dattani 5 - Charles Smith 6 - William (Billy) Mc Kinney Jr.
Há razões para acreditar que estas pessoas tenham cometido crimes de suborno e corrupção violando as leis de Inglaterra e do País de Gales. (...)
Os cidadãos indicados em baixo, que não são do Reino Unido, são considerados sob investigação por terem solicitado, recebido ou facilitado pagamentos que constituam os crimes indicados no anexo 1 (referência a todos os crimes que podem estar em causa):
7. José Sócrates 8. José Marques 9. João Cabral 10. Manuel Pedro.
Resumo de factos e alegações
(...) A investigação relaciona-se com as circunstâncias seguintes: A investigação centra-se no desenvolvimento comercial de um local onde estava localizada a antiga fábrica da 'Firestone', perto de Alcochete, junto da zona de protecção ambiental contígua à Ponte Vasco da Gama. Em 1999, a empresa do Reino Unido R J McKinney conseguiu a pré-aprovação do projecto; o funcionário respectivo é William McKinney Jr. Uma empresa com sede em Portugal, a Smith&Pedro, foi usada como agente local para tornar mais fácil a concessão desta aprovação. Os líderes da Smith&Pedro eram Charles Smith e Manuel Pedro, e o empregado João Cabral. As circunstâncias que levaram à concessão da aprovação estão a ser investigadas. Esta concessão acabou por ser concedida por José Marques, na altura o vice-presidente do Instituto de Conservação (da Natureza). A Polícia Judiciária de Portugal disse à SFO e à Polícia da Cidade de Londres que o facto de a aprovação ter sido concedida tendo em conta a existência de uma zona de protecção ambiental levanta uma forte suspeita de corrupção no procedimento de aprovação. No ano 2000, a parte da RJ McKinney foi vendida a outra empresa do Reino Unido, a Freeport PLC. A Freeport tentou obter uma aprovada Avaliação de Impacto Ambiental, necessária para o desenvolvimento de um espaço comercial de comércio multifunções, que seria chamado Freeport. Os representantes da Freeport para o desenvolvimento deste projecto na zona da Firestone eram Sean Collidge (Presidente do Conselho de Administração), Gary Russel (Director Comercial), Jonathan Rawnsley (Director de empreendimentos), Rick Dattani (assistente em Portugal de Jonathan Rawnsley). A Freeport contratou a Smith&Pedro para ajudar a obter as licenças e aprovações, incluindo a Avaliação de Impacto Ambiental. O primeiro e o segundo requerimento para a Avaliação de Impacto Ambiental foram reprovados pelo Ministério do Ambiente português no ano 2000.
Charles Smith alegou, num interrogatório feito pela Polícia de Londres que a Smith&Pedro foi abordada entre estes dois requerimentos para o pagamento de um suborno considerável para que a aprovação fosse assegurada. No dia 17 de Janeiro de 2002, os representantes da Smith&Pedro e da Freeport tiveram uma reunião com as entidades portuguesas, incluindo o ministro do Ambiente à época, José Sócrates, para discutir uma terceira apresentação da avaliação de impacto ambiental.
Participaram nesta reunião Sean Collidge, Charles Smith, Gary Russel, Manuel Pedro, José Sócrates e outros funcionários públicos e municipais portugueses. Foram discutidas nesta reunião as dificuldades com a Avaliação de Impacto Ambiental apresentada.
Alegadamente, neste mesmo dia, o ministro do Ambiente, José Sócrates, reuniu depois com Sean Collidge, Charles Smith, Gary Russel e Manuel Pedro. Nesta outra reunião, José Sócrates terá alegadamente feito um pedido equivalente a um suborno para assegurar que a Avaliação de Impacto Ambiental fosse aprovada favoravelmente. Alegadamente, ter-se-á chegado a um acordo no qual a Freeport faria, por intermédio de Smith&Pedro, pagamentos a terceiros relacionados com José Sócrates. Estas alegações são extraídas da Carta Rogatória da Procuradoria Geral da República do Montijo, de 12 de Agosto de 2005, suportada por uma série de emails retirados de computadores apreendidos nos escritórios da Smith&Pedro pela Polícia Judiciária portuguesa. Esta lista foi depois fornecida pela polícia judiciária à polícia de Londres. (...)
Estas alegações também foram feitas por Charles Smith numa reunião com Alan Perkins (ex-funcionário da Freeport) e com João Cabral no escritório da Freeport em Portugal no dia 3 de Março de 2006.
Alan Perkins gravou um vídeo da reunião sem o conhecimento de Charles Smith. Este vídeo encontra-se em anexo a um depoimento recolhido pela polícia de Londres, que foi divulgado às autoridades portuguesas (...). Charles Smith negou mais tarde as alegações específicas de corrupção num interrogatório feito sob aviso no dia 17 de Julho de 2007 pela polícia de Londres. Nas semanas depois do dia 17 de Janeiro de 2002, o ministério do Ambiente aprovou uma lei que alterava os limites da reserva natural que tinham impacto sobre o local do Freeport e o ministro do Ambiente apresentou um relatório favorável sobre a Avaliação de Impacto Ambiental.
A terceira Avaliação de Impacto Ambiental foi aprovada a 17 de Março de 2002, dia das eleições das quais resultou que esse ministro tivesse perdido o lugar.
Mais tarde, a Freeport fez três ou quatro pagamentos em parcelas de 50 mil libras à Smith&Pedro. No vídeo de 3 de Março de 2006, Charles Smith alega que são pagamentos de subornos com o objectivo de satisfazer o acordo de 17 de Janeiro de 2002, a partir dos quais fez uma série de pagamentos em dinheiro a um primo de José Sócrates.
A SFO e a polícia de Londres foram informadas pela Polícia Judiciária na reunião no dia 9 de julho de 2008 de que tinham sido obtidas provas de uma série de saques em numerário que se julga estarem relacionados com esta alegação.
Foram feitas algumas alegações menos específicas de que teriam sido pagos montantes maiores - até 5 milhões de libras - a uma empresa de advogados em Portugal ligada a José Sócrates, e pagamentos de subornos a partir do Reino Unido. A SFO e a polícia de Londres foram informadas destas alegações na reunião de 9 de Julho de 2008. A polícia de Londres e a SFO já deram informações às autoridades portuguesas através da assistência judiciária mútua, seguindo uma Carta Rogatória datada de 12 de Agosto de 2005 da Procuradoria Geral da República do Montijo.
Resumindo este foi o material fornecido: 1- Material bancário das contas do Freeport no Barclays; 2 - Material bancário da conta de Francesca Smith no HSBC; 3- Depoimento de Alan Perkins e documentos associados; 4- Transcrições de inquirições sob aviso de Jonathan Rawnsley e Charles Smith. O autor desta carta pode dar mais pormenores sobre o material fornecido e alegações adicionais sobre a investigação no Reino Unido.
Assistência pedida: 1. Lista de inquiridos: Podem, por favor, fornecer um índice ou uma lista de todos os indivíduos interrogados na investigação da da Freeport PLC e RJ McKinney e outros. Queiram confirmar se existe uma transcrição ou outro registo do interrogatório de cada um dos indivíduos se encontra disponível
2. Buscas: Queira confirmar as moradas nas quais foram feitas buscas ou a quem (com excepção dos bancos) foram formalmente entregues mandados judiciais obrigando a apresentar material relacionado com a investigação Freeport PLC e RJ McKinney e outros.Queira confirmar as datas das buscas ou da entrega formal dos mandados de apresentação.
3. Índice do Material: Queira fornecer um índice ou uma lista do material, de computadores e de outro material digital (que não seja dos bancos) resultado de buscas, dos mandados de apresentação ou de outro modo relacionados com esta investigação na investigação do Freeport PLC e da RJ McKinney e outros.
4.Material bancário: Forneçam, por favor, um índice ou lista de material bancário recolhido na investigação do Freeport PLC e da RJ McKinney e outros.
5. Material das vigilâncias: Queiram fornecer uma lista das escutas telefónicas ou outras vigilâncias realizadas nesta investigação na investigação do Freeport PLC e da RJ McKinney e outros.
6. Provas principais: Queiram fornecer uma colecção de documentos de prova centrais identificados que seriam usados para interrogatórios ou para a preparação de interrogatórios a serem feitos pela polícia de Londres e pela SFO na investigação do Freeport PLC e da RJ McKinney e outros.
7. Acesso a material e a testemunhas: No seguimento do pedido 6, para facilitar a investigação no futuro, queira por favor dar autorização para que os representantes da polícia de Londres e da SFO tenham acesso futuro ao conjunto completo de depoimentos de testemunhas e do material a que se referem estes pedidos, devendo ser isto acordado numa data futura.
8. Assistência pendente do Reino Unido: Queiram fornecer dados dos bancos, das contas bancárias e dos códigos de agência das contas bancárias de RJ Mckinney no Reino Unido que seriam solicitados por Portugal através da Assistência Judicial Mútua.
9.Material Bancário e de planeamento ainda pendente: Queiram por favor dar esclarecimentos actualizados sobre quais os dados bancários, para além daqueles do Reino Unido, que é considerado necessário para completar qualquer cadeia de provas relativas a quaisquer transacções que possam ter indícios de corrupção. Queiram por favor dar esclarecimentos actualizados sobre qual o material de planeamento que é identificado como necessário para completar qualquer cadeia de provas relativas a quaisquer procedimentos que possam ser corruptos.
10. Material na posse da Decherts: Está no anexo 2 um índice de material na posse da Decherts Solicitors (empresa de advogados) no Reino Unido. Além disso, a Decherts Solicitors tem imagens digitais do servidor da Freeport PLC. A SFO tentará obter a entrega deste material de forma voluntária ou por mandado judicial. Queira identificar os artigos que constam do índice de materiais dos quais Portugal procuraria obter acesso por meio de assistência judicial mútua. Queira indicar uma lista de termos de busca que Portugal mandaria aplicar ao material digital através da Assistência Judicial Mútua, ou se é solicitada cópia completa da imagem".