Estudo revela o pior resultado desde 1985
Confiança na democracia bate no fundo
01.03.2010 - 07:56 Por Nuno Simas
A satisfação dos portugueses com a democracia bateu no fundo. Eles que são tendencialmente de esquerda e não gostam de maiorias absolutas de um só partido. Têm reservas ao monopólio dos partidos e gostariam de participar mais. Em menos de 40 palavras é o que se pode concluir do estudo "Representação política - O caso português em perspectiva comparada", organizado pelos politólogos André Freire e José Manuel Leite Viegas, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE.
Este é o trabalho mais exaustivo que compara as opiniões e percepções entre eleitores e eleitos jamais feito em Portugal, em 2008, através de inquéritos à população e aos deputados. Uma conclusão prévia: as legislativas de 2009 confirmaram a aversão do eleitorado a uma maioria absoluta de um só partido, retirando-a ao PS. "Embora isso tenha outras explicações, a começar pela crise eco- nómica", afirma André Freire, co-autor do estudo, agora editado pela Sextante.
Freire confessa que não ficou surpreendido com os resultados: "Por exemplo, que o eleitorado é alinhado à esquerda". No capítulo da ideologia e representação política, algumas conclusões interessantes: PS e CDS têm níveis de congruência elevados entre eleitos e eleitores. Ou seja, o posicionamento dos eleitores coincide com o do partido, embora ligeiramente mais à direita do que os seus deputados. As maiores diferenças são no PSD. Os deputados "laranja" estão mais à esquerda do que o seu eleitorado. E quem vota CDU ou Bloco posiciona-se mais à direita do que os seus representantes no Parlamento.
Mas há algo que é incontornável: os portugueses estão muito insatisfeitos com a democracia. "Não se sentem bem representados e esse sentimento tem vindo a aumentar." Desde 1985, a satisfação regista o seu nível mais baixo em 2008. Mas os eleitores não colocam em causa a legitimidade democrática dos eleitos. Ou seja, os portugueses são democratas insatisfeitos, mas democratas, apesar de tudo. Ainda assim gostariam de participar mais, apesar do papel preponderante dos partidos no sistema político.
Freire arrisca mesmo dizer que nos últimos anos "os partidos tornaram-se meros instrumentos dos seus líderes". Nas últimas semanas, exemplificou, num cenário de crise política, "falou-se logo em eleições" e o PS sentiu necessidade de "tocar a rebate em torno do líder". "Mas os eleitores votaram no PS e nada impede, como acontece noutros países europeus, que o PS indique outro primeiro-ministro", afirmou.
Na política não há receitas únicas - "não há soluções que não tenham desvantagens" -, mas Freire retoma a ideia de uma reforma: a votação em lista semifechada. Um sistema misto, com um círculo nacional, e listas regionais. Por outras palavras, o eleitor votaria no partido na lista nacional, mas poderia optar também por votar num determinado candidato. O que obrigaria os partidos a "um esforço suplementar" nas suas escolhas. Tanto que, no estudo, os inquiridos reclamaram uma maior participação na escolha dos deputados.
As maiorias absolutas é que são pouco desejadas pelos eleitores. Embora PS e PSD as defendam. Nos partidos mais pequenos, a preferência é para coligações. Percebe-se porquê, num país em que, após o período revolucionário, só o CDS chegou ao poder em coligação - com PS e PSD.
Confiança na democracia bate no fundo
01.03.2010 - 07:56 Por Nuno Simas
A satisfação dos portugueses com a democracia bateu no fundo. Eles que são tendencialmente de esquerda e não gostam de maiorias absolutas de um só partido. Têm reservas ao monopólio dos partidos e gostariam de participar mais. Em menos de 40 palavras é o que se pode concluir do estudo "Representação política - O caso português em perspectiva comparada", organizado pelos politólogos André Freire e José Manuel Leite Viegas, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE.
Este é o trabalho mais exaustivo que compara as opiniões e percepções entre eleitores e eleitos jamais feito em Portugal, em 2008, através de inquéritos à população e aos deputados. Uma conclusão prévia: as legislativas de 2009 confirmaram a aversão do eleitorado a uma maioria absoluta de um só partido, retirando-a ao PS. "Embora isso tenha outras explicações, a começar pela crise eco- nómica", afirma André Freire, co-autor do estudo, agora editado pela Sextante.
Freire confessa que não ficou surpreendido com os resultados: "Por exemplo, que o eleitorado é alinhado à esquerda". No capítulo da ideologia e representação política, algumas conclusões interessantes: PS e CDS têm níveis de congruência elevados entre eleitos e eleitores. Ou seja, o posicionamento dos eleitores coincide com o do partido, embora ligeiramente mais à direita do que os seus deputados. As maiores diferenças são no PSD. Os deputados "laranja" estão mais à esquerda do que o seu eleitorado. E quem vota CDU ou Bloco posiciona-se mais à direita do que os seus representantes no Parlamento.
Mas há algo que é incontornável: os portugueses estão muito insatisfeitos com a democracia. "Não se sentem bem representados e esse sentimento tem vindo a aumentar." Desde 1985, a satisfação regista o seu nível mais baixo em 2008. Mas os eleitores não colocam em causa a legitimidade democrática dos eleitos. Ou seja, os portugueses são democratas insatisfeitos, mas democratas, apesar de tudo. Ainda assim gostariam de participar mais, apesar do papel preponderante dos partidos no sistema político.
Freire arrisca mesmo dizer que nos últimos anos "os partidos tornaram-se meros instrumentos dos seus líderes". Nas últimas semanas, exemplificou, num cenário de crise política, "falou-se logo em eleições" e o PS sentiu necessidade de "tocar a rebate em torno do líder". "Mas os eleitores votaram no PS e nada impede, como acontece noutros países europeus, que o PS indique outro primeiro-ministro", afirmou.
Na política não há receitas únicas - "não há soluções que não tenham desvantagens" -, mas Freire retoma a ideia de uma reforma: a votação em lista semifechada. Um sistema misto, com um círculo nacional, e listas regionais. Por outras palavras, o eleitor votaria no partido na lista nacional, mas poderia optar também por votar num determinado candidato. O que obrigaria os partidos a "um esforço suplementar" nas suas escolhas. Tanto que, no estudo, os inquiridos reclamaram uma maior participação na escolha dos deputados.
As maiorias absolutas é que são pouco desejadas pelos eleitores. Embora PS e PSD as defendam. Nos partidos mais pequenos, a preferência é para coligações. Percebe-se porquê, num país em que, após o período revolucionário, só o CDS chegou ao poder em coligação - com PS e PSD.
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