1. Os ventos de Verão trazem-nos sempre algumas surpresas. Quando os europeus partem para férias e não querem ouvir falar mais do que das delícias das praias, com água se possível tépida, e dos refúgios nas montanhas arborizadas ou na província, para aqueles cujas raízes não estão nas grandes cidades, surgem sempre acontecimentos inesperados que absorvem as nossas atenções e perturbam a nossa paz.Desta vez, neste início de férias, a actualidade atrai-nos para a Ásia. Para a China, primeiro, onde se escolheu um número de sorte, para os chineses - o 8 - para iniciar os Jogos Olímpicos de Pequim, no dia 8 do 8.º mês de 2008, às 8 horas, 8 minutos e 8 segundos. Quem tem princípios e é meticuloso, é assim.
Trata-se de um grande acontecimento.
A China, com reservas, obviamente, procura abrir-se ao mundo, contando simbolicamente, mais de quatro mil anos de história chinesa, com engenho, criatividade e bom gosto. Todo o espectáculo foi encenado pelo grande cineasta chinês, muito conhecido no Ocidente, Zhang Yimou, antigo dissidente, que aceitou o desafio de coordenar a complexa mise-en-scène dos Jogos olímpicos, onde ressaltam problemas políticos diversos de algum melindre.
O Presidente Chinês, Hu Jintao, declarou: "O Governo e o povo chinês cumpriram seriamente os seus compromissos perante a comunidade internacional." Fez-se um esforço, é evidente, mas não esqueçamos, em matéria de direitos humanos - e nomeadamente no caso do Tibete e de outras minorias -, a violência e a brutalidade com que estas populações foram contidas nas suas reclamações. Por outro lado, mesmo em Pequim, próximo do estádio olímpico - que é uma jóia arquitectónica de excepcional beleza e originalidade -, foram demolidas centenas de residências pobres, deixando os antigos ocupantes sem habitação, para a pobreza dos bairros circundantes não contrastar com o fausto, arrasador, devemos reconhecer, do grande estádio onde se alberga a festa. Essa é inegavelmente uma das inevitáveis contradições dos regimes totalitários.
Contudo, os Jogos Olímpicos de Pequim não se podem - nem devem - comparar com os Jogos de Berlim, nas vésperas da II Guerra Mundial. Neste caso havia um país totalitário dominado por um ditador, Hitler, que se preparava activamente para dominar a Europa. Aqui, a China, não está a ponto de desencadear nenhuma guerra. É um país emergente, que quer ser reconhecido e respeitado como tal, apesar dos inúmeros problemas internos - e contradições que não conseguiu ultrapassar - e que requerem tempo, prudência e paz para digerir.
Por isso o Presidente Sarkozy foi leviano - tanto mais exercendo a presidência da União Europeia - ao afirmar que não estaria presente na abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim por causa do Tibete e de outros atentados aos direitos humanos, quando esteve presente, tendo de dar o dito por não dito. O que começa a acontecer-lhe com demasiada frequência
2.A Rússia, outro país emergente, com uma população relativamente pouco numerosa, dada a sua imensa extensão, e riquezas naturais imensas (petróleo, gás, minerais, cereais, florestas imensas e potencialidades de vário tipo para explorar), perdeu, com o colapso do comunismo, o seu lugar de segunda potência mundial e depois disso tem vindo a ser sistematicamente humilhada pelo Ocidente.
Um erro fatal.
Putin, com o seu estilo enigmático e fechado, não se deixou diminuir. E em poucos anos levantou a Rússia do pântano em que se encontrava, recuperou o orgulho nacional russo e mostrou ao mundo que a Rússia não pode ser menosprezada nem, muito menos, humilhada.Mas tem problemas étnicos, culturais e históricos, no complexo xadrez das suas populações, que não são fáceis de resolver pela força, como nos tempos passados de Estaline e de Brejenev. A Chechénia tem sido um deles, tem-lhe trazido inúmeras preocupações e está longe de estar resolvido. E agora a Rússia e a Geórgia estão a resvalar para uma guerra aberta, extremamente perigosa para a Rússia e para o Ocidente, incluindo a NATO, que Bush procura empurrar para mais essa aventura. Não lhe basta o Afeganistão.
Tbilissi, a terra do nascimento de Estaline, capital da Geórgia, investiu contra o enclave da Ossétia do Sul. E Moscovo replicou enviando as suas forças militares compostas por carros de combate super poderosos. Sabendo-se das dificuldades que têm suscitado as bases de mísseis, dirigidas contra a Rússia - e a penetração que a NATO tem tido em países como Azerbaijão, a Ucrânia (que tem sido extremamente prudente, para não alarmar a Rússia), a Moldávia, o Cazaquistão e agora a Geórgia, pode-se estar a criar um barril de pólvora muito perigoso, no Cáucaso, dotado de petróleo e de gás.
A União Europeia assiste aparentemente impávida - ou impotente - a estas operações, por onde passam importantes oleodutos, entre americanos e russos, como se um conflito desta ordem não viesse, necessariamente, a afectá-la imenso. Enfim, os próximos dias dar-nos-ão novos elementos de análise para este ponto nevrálgico do mundo. Veremos.
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