terça-feira, 21 de outubro de 2008

IV Carta a Renato Sampaio


Porto, 21 de Outubro de 2008
Renato Sampaio:
Era para lhe escrever na passada quinta-feira, mas decidi esticar a data. Afinal no próximo sábado vamos a votos e V. continua a resistir ao desafio, recusando-se a esclarecer as divergências, olhos nos olhos. Também tem conseguido com o silêncio evitar ser obrigado a desdizer algumas insinuações torpes que têm andado por aí a espalhar. Parabéns pela resistência. V., nisto, em fugir ao debate, é mesmo muito forte!
A técnica de “tentar passar entre a chuva sem se molhar” já lhe terá sido útil na vida, porventura continuará a sê-lo. Mas para quem quer liderar uma “distrital” dum partido democrático e se alcandora ao hemiciclo parlamentar, é fraca faculdade. É mesmo uma desonra para si, e um desprestígio para o partido e para a instituição parlamentar. V. sabe apresentar uma moção com várias dezenas de páginas que não dizem nada, ninguém lerá e talvez nem V. tenha lido, sabe mandar textos para os jornais sem contraditório, é muito engraçado em entrevistas a dizer que se fosse milionário comprava um Ferrari – o que é um sentimento profundamente socialista –, mas não é capaz de dirimir argumentos com os seus adversários políticos num debate necessário porque precede uma eleição, o que é a essência de todo o procedimento democrático. Lamento ser obrigado a dizer-lhe que V. não sabe o que é a democracia, V. não tem cultura democrática. E o pior é que quem é prejudicado são os militantes, os cidadãos e, afinal, a região e o país, pois não me parece que o Distrito do Porto tenha no contexto nacional tão pouca importância quanta V. lhe dá ou tão pouca importância quanta V. tem.
Quer exemplos? Vou dar-lhe alguns.
Com a sua atitude – seja incapacidade ou cobardia – V. é responsável por ninguém ser esclarecido sobre a verdadeira situação da estagnação económica do Norte, factor de peso para a actual situação económica do país. Ou será que a nível do distrito, sendo o que tem sofrido mais encerramentos de empresas do país, não estaremos, e há já algum tempo, numa situação de forte recessão regional? Tê-mo-lo afirmado com insistência, mas V., formado na ideia de que quem não está connosco está “contranosco”, popularizada por Santos Costa – ministro da tropa de Salazar, considerará que isto é a voz do Rui Rio, do PCP ou do BE. O facto de nos termos tornado, nos últimos tempos, na região mais pobre da Europa dos Quinze também não lhe diz nada?
Toda a gente compreende a situação difícil em que V. está. É o próprio João Cravinho, sempre atentíssimo à situação económica do país e ao papel do Norte, que tem vindo a afirmar sem rebuço, que o factor principal da crise económica portuguesa é a queda do Norte, e veio sublinhar, nos últimos dias, que a actual crise financeira global afectará em Portugal sobretudo o Norte, reiterando a necessidade de um plano económico especial para a região, como temos vindo a martelar durante este quase ano inteiro de campanha, a que a manipulação do calendário eleitoral pelo seu amigo engenheiro técnico José Lelo e Cia, nos obrigou.
No entanto, V. está errado. Ao fugir à peleja de ideias, põe-se numa situação muito mais difícil. Toda a gente percebe que V. não tem argumento nenhum, enquanto eu estou convencido que V. teria algum, porque acho que toda a gente tem uma parte, mesmo que pequena, de razão, em qualquer debate. É possível que eu exagere nas análises que faço, mas a culpa é sua por não ter a ombridade de fazer o contraditório. Enfim, talvez eu exagere, ou, desgraçadamente, talvez não, talvez seja ainda benevolente.
O mesmo com a situação social. Tenho dito que o desemprego no Norte é muito superior à média do país, não estará longe do dobro, e se lhe somarmos a nova emigração, ultrapassará em muito, esse dobro. Toda a gente conhece os números aterradores dos novos pedidos para o Rendimento Mínimo no distrito, profusamente publicados pela imprensa, mas talvez, no seu afã permanente de defender o poder central e de esconder os males da nossa realidade, talvez V. tivesse outros números que mostrassem que a Imprensa mentia, ou estava a ser manipulada pelo inimigo.
Para não falar do esbulho das dezenas de milhões dos fundos temáticos horizontais do QREN que foram desviados do país, mormente do Norte, para Lisboa, que não podia receber nem um cêntimo, em nome de um tal “efeito de difusão” sobre o país, que não passa de um efeito de aspiração ou de centrifugação e que, na verdade, é um autêntico assalto ao país por parte duma clique instalada para “gerir” a seu contento os fundos comunitários, assunto sobre que os tribunais decidirão.
Ou da inenarrável tentativa de discriminar a região do Porto para portajar as SCUT, do boicote pela ANA do negócio do Porto com a Ryanair, da tomada do Metro pelo poder central, do calendário inaceitável dos novos traçados do Metro mas que felizmente melhoram em poucas horas quando a oposição autárquica bate o pé (e V. bate palmas), do enfraquecimento da RTP no Porto, ou de mais uma baixa consecutiva do peso proporcional da fatia do Distrito do Porto no PIDAC nacional, mesmo que haja aumento do investimento público, como não podia deixar de ser depois do corte radical do ano passado, assuntos sobre os quais V. nunca fez nada, nunca emitiu um som ou um qualquer sinal a não ser os costumeiros acenos aquiescentes do “Sim Senhor!”
Quantos temas não teríamos para discutir sobre a defesa dos interesses do Porto! E nalguns até teríamos convergência como em relação ao Aleixo em que V. veio a reboque da minha posição!
Se tivesse tido a correcção de alinhar nos debates que eu próprio e os media lhe propuseram, talvez demonstrasse que se fartou de batalhar como presidente da Federação do Porto e como deputado pela defesa económica e social do Norte, coisa que ninguém viu e toda a gente está convencida que V. não fez. Está a ver como fez mal em não aceitar os debates em que podia demonstrar, pelo menos numa partezinha, o contrário do que toda a gente pensa?
Claro que ao não aceitar os debates, V. mostrou que, infelizmente, as coisas, em relação a si, são como parecem, se é que não serão piores. V. nunca abriu a boca, nem alto, nem baixo, em defesa do Porto, nem no plano económico, nem no plano social. Se não, tinha vindo a debate dizer-me nos olhos as mentiras que anda para aí a dizer sempre que não tem contradita, a única situação em que V. é capaz de falar. E nunca o fez porque V. não está na política para servir a região mas sim para ser servil ao poder central e assim aguentar-se na sua tardeira carreira política.
Tem o desplante de dizer para os jornais que no Porto há oposição agora e não houve há dois anos, o que demonstrará que a motivação das oposições é o poder? O mais significativo da sua personalidade política é que V. acha que ter oposição é mau, isso todos tínhamos percebido. Mas V. junta à falta de cultura democrática a nesciência mais básica. Então a oposição havia de ser para quê, senão para lutar pelo poder? Só que há quem lute pelo poder para mudar as coisas que é preciso mudar de acordo com os seus valores, e há quem lute pelo o poder apenas para mudar de residência, se instalar em Lisboa e não procurar mais trabalho.
V. interroga-se para os jornais sobre a razão pela qual há dois anos ninguém se candidatou e agora há candidaturas contra si, sem contar com as candidaturas aventadas e desistidas do José Luís Carneiro, do Joaquim Couto, do Celso Carvalho, e de outros que também consideram que é preciso mudar a liderança federativa mas não quiseram dar o peito às balas? V. não é capaz de discernir a razão principal de haver tanta oposição este ano e não haver há dois anos? É simples: a razão é V., meu caro!
Não fosse V. fazer a pior gestão de sempre do PS-Porto, talvez não houvesse oposição nenhuma a candidatar-se o que, mesmo assim, seria mau, porque poderia dar origem a mais um mandato de “partido único”como foi este seu. Não fosse V. dar a pior imagem de sempre do PS-Porto, talvez não houvesse candidatos que o incomodassem. Não fosse V. abandonar as suas responsabilidades, fazendo uma gestão de fim-de-semana da maior Federação do País, instalado com quase todo o seu Secretariado em Lisboa, num distrito que é cabeça de metade de Portugal, talvez não houvesse o sentimento de que é preciso mudar a liderança e talvez ninguém lhe tivesse estragado a imagem que V. tentou montar em Lisboa de capataz eficaz da roça do Norte.
V. é a razão de ser da sua oposição! Há dois anos não havia V.! E só quem o conhecia bem – o que não era o meu caso que só o conheço de eminência parda da campanha falhada do Assis e de duas ou três intervenções insossas e minimalistas – é que se podia e devia candidatar.
Ou será que, quando V. fala de que há candidaturas contra si – coitadinho! – porque há poder, estará a insinuar que eu quero algum poder para mim e essa é a minha motivação, como alguns capangas seus que vivem dos lugares de nomeação política têm andado a espalhar?
Será? Pois eu desde que me apresentei em 31 de Janeiro de 2008 afirmei que se for eleito não serei candidato nem à Assembleia da República nem ao Parlamento europeu, entre outras razões, porque o Porto merece uma liderança a tempo inteiro e não lideranças pelo telefone ou de fim-de-semana! Pois já que vem falar de desejos de poderes, desafio-o a dizer o mesmo que eu!
Apresentei-me, numa hora em que todos se encolheram, pelo imperativo do dever da minha consciência. Pelo Porto donde sou oriundo e que é minha paixão, mas também pelo projecto socialista em que me formei desde a adolescência.
Porque consigo o PS continuará na rota do fundo, continuará a descer ao abismo em que tem vindo a mergulhar.
Consigo, o PS não ganhará uma única nova Câmara no Distrito e arriscar-se-á a perder alguma ou algumas. V. não aceita que as “concelhias” que o entendam tenham liberdade para fazer coligações à esquerda (com um ou os dois partidos) contra as coligações da direita o que, neste momento, impede a vitória em vários municípios, nomeadamente no do Porto, onde qualquer dos candidatos que estão na agenda da “concelhia” ganhará com uma coligação á esquerda! E porquê? V. gostaria de ganhar , seria um grande sucesso político e, embora seja um socialista de direita e sobretudo pragmático, não tem problemas em aliar-se seja com quem for. O problema é que V. não se atreve a ter um pensamento próprio, V. é um pau-mandado de Lisboa, se S.Exas. entendem que podem fazer coligações à esquerda mas o resto do país não, V., simplesmente, mete a viola no saco e aquiesce. Está tudo bem!
De resto, V. é responsável pela situação de Matosinhos. Em 2 anos e sete meses de funções, V. nunca fez uma única “démarche” para encontrar luz ao fundo do túnel. Enquanto eu em 9 meses estabeleci pontes entre antagonistas, sou respeitado e ouvido por ambas as partes, tenho soluções concretas para que a câmara de Matosinhos se mantenha socialista.
V. só sabe repetir as dicas sem qualquer peso legal que lhe sopram em Lisboa. Quem está na Câmara, continua a estar pelo facto de estar, isso seria um princípio socialista! Piada! Então porque não continuou o Narciso no último mandato? Há pessoas e “princípios” que se apanham mais depressa do que um coxo!
E em Valongo, V. está à espera que o tempo desta eleição passe, alimentando a esperança dos dois candidatos a candidatos cujas posições se vão extremando e enquistando. Depois virá a guerra e V. também será responsável porque deixou crescer uma situação que não pode dar bom resultado e podemos não ganhar uma das câmaras que se podia ganhar.
E a arrogância que, segundo os militantes dizem, o tornam insuportável? Confesso que nunca senti isso de si. Nem o considero insuportável. Nem tenho, de resto, nada de pessoal contra si. Talvez V. só seja assim para alguns.
Será o caso de se pôr a proferir sentenças sobre quem são e quem deixam de ser os candidatos à Câmara, como em Matosinhos, em nome do tal “princípio”, ou como no Porto em que teve de se encolher porque não tem nenhum candidato firmado e a “concelhia” mandou-o calar-se sob risco de me apoiarem em força?
Mas pior é o que V. disse há dias sobre Leça da Palmeira. Que determinado Camarada não seria candidato á Junta! V. tem consciência de quem é , de quais são as suas competências, da figurinha que anda a fazer? Que tem V. a ver com as juntas? E se houvesse algum problema disciplinar, que tinha V. a ver com isso? É porventura também o Conselho Jurisdicional? Conheço algumas pessoas que estão no órgão jurisdicional do partido no Porto. Não acredito que se submetem aos seus ditames, bem pelo contrário. Se V. não consegue a mínima contenção no que diz, e não consegue travar um debate quando deve, como pode ser presidente da federação?
V. é mais do mesmo na linha declinante do PS-Porto por todos os motivos apontados, mas a razão principal é a de que o povo do distrito do Porto não se identifica com um PS Porto dirigido por si, um PS inexistente que se limita a ser uma ressonância das ordens do patrão, um PS que não tem combatividade, nem determinação, nem capacidade de vencer.
Ambição de vencer? Não me faça rir, V. não vencerá nada, como nunca venceu nada. E a sua única ambição é pessoal, não a da região com que não se identifica. V. só é feliz na capital a fazer de pajem. Deixe-se por lá ficar. E deixe-nos aqui pôr o PS no caminho das vitórias, que só podem ser as vitórias da região.
Mas já vi que não é isso que vai fazer. V. Está furioso por ter oposição, lançou com os seus amigos campanhas miseráveis de intimidação em toda a parte contra os meus delegados, que atingiram as raias do fascismo em Santo Tirso, e prepara já, para o próximo sábado, uma chapelada das do costume.
V. e os seus amigos manipularam a data desta eleição, só me forneceram muito tardiamente as listagens de militantes que tive de arrancar a ferros, impuseram 8 representantes seus na Comissão Organizadora do Congresso contra apenas 1 meu também metido a ferros, utilizaram despudoradamente o aparelho partidário para montar as listas de delegados e fazer tomadas de posição nas secções que são ilegítimas e agora pretendem que, ao contrário do definido pelo regulamento, possam “chapelar” à boca das urnas, deixando pagar em numerário que é aquela treta que todos bem conhecemos para permitir os papelinhos dos secretariados e do tesoureiro da Secção a dizer que o rapaz tem as quotas em dia quando afinal não tem.
V. enfiam-me com uma listagem de 18 mil militantes dos quais nem um terço existem com as cotas em dia, e se é normal poderem pagar até à hora da votação, isso tem de ser, nos termos do regulamento, por Multibanco e exibindo o respectivo talão ao lado do cartão de militante, não com o papelucho da secção a dizer que se pode enfiar o chapéu. Se quer enfiar chapéus, ao menos pague-os! Mas no Multibanco!
E sobre isto a sua COC dos 8-1- entendeu não tomar posição por ser um acto administrativo! Acto administrativo? É o acto com que se tem o poder pelo menos nos últimos anos no PS-Porto, e não é só no Porto nem só no PS. É o que vai permitir que o aparelho no sábado vá trabalhar todo, ou quase todo, para si, pondo os mortos a votar.
Mas ainda assim, pode ter uma surpresa. Talvez eu seja ingénuo, como o General Delgado, mas mesmo assim, vamos a lá a ver.
Claro que esta carta, como todas as outras, é para conhecimento público. E claro que, já não é uma carta desafio, mas uma carta acusação.
Ainda assim, votos de muita saúde e as melhores saudações.


Pedro Baptista

1 comentário:

Primo de Amarante disse...

Caro Pedro:
Há um ditado que diz "não devemos deitar pérolas a porcos".

Vai ser, como de costume, a mercearia dos votos a ganhar a Distrital, mas quem perde é o PS que se vai tornando numa rua de má fama, por onde não querem passar as pessoas com alguma dignidade.