Investigação do Ministério Público vai averiguar se houve crime de abuso de poder na apreensão de livro em Braga
(JN)NUNO MIGUEL MAIA E PEDRO ANTUNES PEREIRA 26.02.2009
O Ministério Público abriu um inquérito-crime para averiguar os factos ocorridos em torno da apreensão, pela PSP, na segunda-feira, do livro "Pornocracia", em Braga. Em causa pode estar um crime de abuso de poder por parte das autoridades.
Apesar de a própria Direcção Nacional da PSP ter-se justificado publicamente, os factos vão ser averiguados pelo MP.
De acordo com informações recolhidas pelo JN, a abertura deste inquérito-crime foi iniciativa própria do MP, por poder estar em causa um eventual atentado à liberdade de expressão, ao ser proibida a exposição do livro, cuja capa retrata "A origem do Mundo", do pintor Gustave Coubert.
A vir a ser considerada ilícita a apreensão dos livros retratados com nu artístico, a PSP pode vir a ter de responder por crime de abuso de poder. Porém, para a averiguação dos factos sob o ponto de vista criminal e da respectiva consciência da ilicitude por parte dos agentes da PSP, poderão ser tidos em conta vários outros factores. Como uma alegada ignorância sobre a existência da pintura em nu artístico, que pode ter levado a uma confusão com pornografia pura e simples.
A PSP justificou a sua actuação pela necessidade de "acautelar" e evitar "confrontos físicos" no recinto da feira onde o livro estava à venda, face a várias queixas apresentadas por pais de crianças atraídas pela obra e que, por sua vez, chamaram colegas da mesma idade.
A apreensão da PSP poderia, assim, justificar-se ao abrigo de um decreto-lei, datado de 1976, que proíbe a exibição, em locais não autorizados, de material "pornográfico" ou com "conteúdo obsceno". Estão excluídas, porém, as obras de arte e formas de exposição do "erótico" ou do "nu artístico", refere o preâmbulo da legislação. Segundo o decreto-lei de 1976, as infracções serão punidas com pena de prisão até seis meses ou multa entre cinco e mil euros.
Por seu lado, o livreiro a quem a PSP apreendeu cinco exemplares do livro de Catherine Breillat vai manter a decisão de enviar o caso para os tribunais, mesmo após a Direcção Nacional da PSP ter garantido a devolução das publicações.
Para António Lopes, que, até ao final da tarde de ontem, ainda não tinha recebido os exemplares apreendidos, "a queixa mantém-se porque a PSP não reconhece que cometeu uma ilegalidade".
Indignação e queixas
O líder parlamentar do PS condenou, ontem, a apreensão cautelar de vários exemplares de um livro, em Braga, por suposta divulgação de pornografia, considerando que a actuação da PSP violou o direito à liberdade de expressão. "Este acto viola o direito à liberdade de expressão. É uma manifestação censória de obscurantismo", declarou Alberto Martins, à Lusa.
Também ontem, o livreiro envolvido no incidente, António Lopes, fez seguir exposições para todos os grupos parlamentares, Governo, presidente da República e comissão parlamentar de liberdades e garantias.
António Lopes não descarta a hipótese de enviar uma queixa para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, "até para corresponder ao pedido dos polícias que apreenderam os livros e que disserem que se tivéssemos alguma coisa a protestar que o fizéssemos para o Tribunal Europeu. É o que vamos fazer".
O JN sabe que há deputados interessados em pedir esclarecimentos ao Ministério da Administração Interna.
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