segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Governo inscreveu nas GOP a criação de uma estrutura para fazer acompanhamento rigoroso dos contratos
Parcerias de privados com Estado ultrapassam os 51 mil milhões até 2017
25.01.2010 - 08h39
Dividido pelo número de anos que nos separam até 2017, os compromissos de investimento já anunciados pelo Governo e que deverão ser contratualizados através de parcerias público-privadas (PPP) permitiriam lançar um projecto de alta velocidade por ano. Seriam 8,5 mil milhões de euros por ano, para totalizar os mais de 51 mil milhões de euros de investimento que estão anunciados até final de 2017. Um montante que ronda cerca de um terço de toda a riqueza nacional que é produzida num ano no país.
Estes números a que chegou a Associação Nacional de Empreiteiros de Obras Públicas (ANEOP) colocam Portugal como o segundo país da Europa que mais tem apostado no estabelecimento deste tipo de parceria. Já ultrapassou a Alemanha e a Grã-Bretanha (o país que foi pioneiro neste tipo de contratos) e aproxima-se, a passos largos, da campeã, Espanha.
Se a comparação fosse feita em termos de percentagem de investimento face ao Produto Interno Bruto, há muito que Portugal é o campeão da Europa a 27 com recurso a este tipo de contratos - mas isso é mais demérito da riqueza do país, cuja produção é curta quando comparada com outros. A comparação feita pelo volume de investimento poderá ajudar a perceber a dimensão da aposta que os sucessivos governos, nos últimos 15 anos, têm feito nestes contratos. Porque ele permite, entre outras coisas, avançar de imediato com as infra-estruturas e serviços, sem que os custos dessa contratação se reflictam no curto-médio prazo, mas antes ao longo do prazo de vida da concessão que, em Portugal, se tem convencionado ser de 30 anos.
Por isso, reflectem os especialistas em parcerias público-privadas, como Mariana Abrantes de Sousa, as PPP acabaram por se tornar a regra, com a elegibilidade dos projectos para parceria a ser muito alargada. O actual universo das parcerias público-privadas inclui 86 concessões, das quais 62 estão já em exploração, 17 em fase de investimento e nove em fase de lançamento. A economista admite que estas PPP permitiram que Portugal recuperasse do défice de investimento histórico, anterior a 1986. E demonstra, num estudo que apresentou num workshop organizado pela ANEOP em Novembro, como o investimento directo da administração pública tem vindo a diminuir, desde 1997, mas o investimento em transporte se manteve. Mas o recurso continuado às parcerias público-privadas trouxe outro risco: o investimento público tornou-se dependente dos mercados financeiros, quer em montante a investir quer na selecção de projectos.
Estradas com maior peso
O sector dos transportes e as PPP rodoviárias asseguram uma fatia de cerca de 40 por cento das parcerias contratadas, sendo que a variação das rendas previstas e a previsão dos encargos com as concessões (que duram, em média, 30 anos) poderão atingir, segundo os analistas, os três milmilhões de euros num ano.
Os responsáveis da ANEOP acreditam que se não fossem estas parcerias não se teriam investido oito mil milhões de euros nas concessões rodoviárias que avançaram entre 1999 e 2003 (onde se incluem as Scut). Se fossem lançadas em regime tradicional, admite a ANEOP, teriam custado 10,3 mil milhões (valor da construção das infra-estruturas, a valores actualizados).
Por isso, defende Manuel Agria, o recurso às PPP continuará a ser a melhor forma de avançar com o investimento. E se agora, "que estamos na fase de capital intensivo e de rentabilidades negativas nos contratos", estes mesmos contratos pesam no endividamento do país, esta "situação macroeconómica" vai alterar-se quando o investimento inicial estiver amortecido e se chegar à fase de rentabilizar as infra-estruturas. "Nós ainda estamos na infância da arte, e com uma maturidade muito reduzida em concursos de PPP. Mas os dados que já existem permitem avaliar este instrumento de uma forma positiva", afirma Manuel Agria, admitindo, porém, uma "série de infelicidades" que se abateu sobre o programa de investimentos: "O facto de uma grande parte ter sido lançada numa fase de crise económica e de crédito", e por terem sido concentradas as decisões de investimento nos últimos dois a três anos.
Mariana Abrantes de Sousa recorda que Portugal ainda sofre de défice de crescimento, apesar de ter recuperado de défice de investimento "com recurso talvez excessivo a PPP". Até porque, afirma, estas têm potenciado "uma desorçamentação do OE do ano, mas com encargos plurianuais extra-orçamentais crescentes".
"Compete rever a experiência portuguesa com a PPP no contexto da gestão do investimento público para avaliar se este instrumento tem sido utilizado da melhor maneira para garantir crescimento sustentável", defendeu a economista.

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