Sampaio Bruno e o Federalismo
Pedro Baptista, Entre as Artes e as Letras, 13.1.2010
Coube a Sampaio Bruno aprofundar entre nós o ponto de vista federalista de organização social, administrativa e política, em documentos que, publicados entre Outubro e Novembro de 1881, no diário portuense “A Folha Nova”, nunca foram alvo de uma investigação analítica e que, por iniciativa de trabalhadores científicos do Centro Regional do Norte da UC vão, com a chancela da IN-CM, estar à disposição pública no correr deste ano.
Aí, Bruno distingue o princípio federalista dos iberismos a que os monárquicos queriam colar as posições republicanas. Defende que é o “princípio monárquico” que, sendo por “essência guerreiro”, tem levado os príncipes dominantes em Espanha, não só a procurarem “trocar a coroa de rei pela do império ibérico”, como a oferecerem-se como colaboradores a todos os que têm pretendido remodelar o mapa europeu sacrificando Portugal.
Não viria de Espanha qualquer ideia anexionista, se constituísse uma larga república federativa, pois o direito de paz e guerra seria da competência do Conselho Federal, com delegados de todos os estados e de acordo com o princípio federativo contratual.
Só nessas condições, surgiria o momento de interrogar os portugueses sobre a conveniência de fazerem parte dessa federação, mediante um pacto em que se estabelecessem as relações entre os dois países, discutidos pelas Assembleias portuguesa e espanhola e submetido a um plebiscito português, capacidade decisória, portanto, bem superior à da actual integração na União Europeia…
Importa é que Bruno afirma que mesmo que o princípio federativo não consiga constituir uma república federativa ibérica, ”ele dentro de cada país se há-de aplicar forçosamente em república, sob pena de esta o não ser”, dividindo o Estado em municípios e cantões!
Todavia, para Bruno, entre nós, dever-se-ia ir mais longe. Com a paróquia civil, o município, o cantão, o Estado e a Federação, Portugal deveria ser dividido em dois Estados, um no Norte, outro no Sul, tendo o primeiro como capital o Porto e o segundo Lisboa, que seria ao mesmo tempo capital da federação portuguesa ou Estado federal.
No mesmo sentido, se organizaria a Madeira, os Açores e as “possessões do Ultramar”, sendo este o único caminho de conservar estas regiões ligadas ao continente, pois “prosseguindo-se na política unitarista de extorsão de que são vítimas, tarde ou cedo, como as que as precederam, se desmembrarão da mãe-pátria”.
Mas Bruno esclarece ainda um pouco mais o projecto de organização federativo: cada parte terá como limite para a sua soberania os direitos imprescritíveis da personalidade humana, funcionará pelo sufrágio universal directo corrigido com o princípio da representação das minorias, e será autónomo na sua esfera específica, sem qualquer interferência superior, tal como ficará estipulada no “pacto fundamental da nação”.
A primeira traição da república portuguesa implantada em 1910 ao seu próprio programa, firmado desde 1890 pela pena de Teófilo Braga, foi a imposição do estado unitário. A consciência de que já vimos o que deu e também de que deu o que tinha para dar, implica reflexão, sem tabus, sobre uma alternativa à esquizofrenia macrócefala sob que vivemos. E sobre o pensamento bruniano.
Pedro Baptista, Entre as Artes e as Letras, 13.1.2010
Coube a Sampaio Bruno aprofundar entre nós o ponto de vista federalista de organização social, administrativa e política, em documentos que, publicados entre Outubro e Novembro de 1881, no diário portuense “A Folha Nova”, nunca foram alvo de uma investigação analítica e que, por iniciativa de trabalhadores científicos do Centro Regional do Norte da UC vão, com a chancela da IN-CM, estar à disposição pública no correr deste ano.
Aí, Bruno distingue o princípio federalista dos iberismos a que os monárquicos queriam colar as posições republicanas. Defende que é o “princípio monárquico” que, sendo por “essência guerreiro”, tem levado os príncipes dominantes em Espanha, não só a procurarem “trocar a coroa de rei pela do império ibérico”, como a oferecerem-se como colaboradores a todos os que têm pretendido remodelar o mapa europeu sacrificando Portugal.
Não viria de Espanha qualquer ideia anexionista, se constituísse uma larga república federativa, pois o direito de paz e guerra seria da competência do Conselho Federal, com delegados de todos os estados e de acordo com o princípio federativo contratual.
Só nessas condições, surgiria o momento de interrogar os portugueses sobre a conveniência de fazerem parte dessa federação, mediante um pacto em que se estabelecessem as relações entre os dois países, discutidos pelas Assembleias portuguesa e espanhola e submetido a um plebiscito português, capacidade decisória, portanto, bem superior à da actual integração na União Europeia…
Importa é que Bruno afirma que mesmo que o princípio federativo não consiga constituir uma república federativa ibérica, ”ele dentro de cada país se há-de aplicar forçosamente em república, sob pena de esta o não ser”, dividindo o Estado em municípios e cantões!
Todavia, para Bruno, entre nós, dever-se-ia ir mais longe. Com a paróquia civil, o município, o cantão, o Estado e a Federação, Portugal deveria ser dividido em dois Estados, um no Norte, outro no Sul, tendo o primeiro como capital o Porto e o segundo Lisboa, que seria ao mesmo tempo capital da federação portuguesa ou Estado federal.
No mesmo sentido, se organizaria a Madeira, os Açores e as “possessões do Ultramar”, sendo este o único caminho de conservar estas regiões ligadas ao continente, pois “prosseguindo-se na política unitarista de extorsão de que são vítimas, tarde ou cedo, como as que as precederam, se desmembrarão da mãe-pátria”.
Mas Bruno esclarece ainda um pouco mais o projecto de organização federativo: cada parte terá como limite para a sua soberania os direitos imprescritíveis da personalidade humana, funcionará pelo sufrágio universal directo corrigido com o princípio da representação das minorias, e será autónomo na sua esfera específica, sem qualquer interferência superior, tal como ficará estipulada no “pacto fundamental da nação”.
A primeira traição da república portuguesa implantada em 1910 ao seu próprio programa, firmado desde 1890 pela pena de Teófilo Braga, foi a imposição do estado unitário. A consciência de que já vimos o que deu e também de que deu o que tinha para dar, implica reflexão, sem tabus, sobre uma alternativa à esquizofrenia macrócefala sob que vivemos. E sobre o pensamento bruniano.
1 comentário:
O Sampaio Bruno já dizia estas coisas todas? Somos mesmo muito ignorantes. Têm-nos mantido na ignorância. Este blog é um bom serviço público.
Enviar um comentário