Casa-oficina António Carneiro abandonada
Manuel Vitorino, Malacó (JN, 02.03.2008)
Já só restam as paredes e o telhado da Casa-Oficina António Carneiro, no Porto, mestre do naturalismo português, autor do famoso tríptico "A Vida". O edifício mandado construir pelo avó, nos anos 20, foi vandalizado e até a placa de bronze da fachada foi roubada.
"Há dias, passei por lá e fiquei chocado com tanto abandono", contou, ao JN, Nuno Carneiro, neto do pintor.
Há cerca de 11 anos, a Câmara do Porto fechou a casa do "retratista de almas", na Rua de António Carneiro, ao Bonfim, para proceder a obras de restauro e reabilitação. Onze anos depois, o edifício está em ruínas e a maior parte do espólio museológico doado pela família à Câmara foi armazenado. "Custou-me muito ver aquilo. Foi uma dor de alma observar aquela casa votada ao mais completo abandono. A memória do artista devia ser respeitada", lembrou, ainda, Nuno Carneiro, neto do artista, director da revista "A Águia", e cujo universo literário levou-o a conhecer Pascoaes, Antero Quental e Raul Brandão.
Perante o alerta formulado pelo JN, Gonçalo Gonçalves, vereador da Cultura, afirmou "conhecer bem o dossiê" e, por e-mail, disse estar prevista a reabilitação da casa-oficina António Carneiro "para este ano".
Apontada uma data para as obras de restauro, importa acrescentar um facto não foi por falta de estudos que, ao longo dos últimos 11 anos, a reabilitação do edifício não avançou. Foram feitos dois projectos, um deles mantendo a traça original da casa-oficina; outro mais arrojado, propondo a ampliação do edifício até aos jardins, através de uma estrutura em vidro. "A Câmara nunca teve vontade em fazer as obras. Até houve uma verba de 500 mil euros inscrita no Plano e Orçamento da Câmara do Porto para o arranque da empreitada. Mas nada foi feito. Agora, dizem que vão arrancar este ano. Já só acredito quando as obras tiverem lugar", afirmou uma estudiosa da obra de António Carneiro."Todos os estudos ficaram no papel e, até agora, não existiu grande interesse e vontade em recuperar um edifício de um grande pintor da cidade. Será que querem apagar a memória da casa e o espírito do lugar"?, perguntou Laura Castro, professora de História de Arte.O mesmo sentimento foi partilhado pelo escultor Lino António (filho do pintor Gouveia Portuense) e igualmente conhecedor da obra pictórica de António Carneiro "O fecho da casa-oficina ficou a dever-se à perda de memória da cidade e de alguns dos seus símbolos. António Carneiro deixou-nos uma obra imensa. Será que estamos a ser dignos herdeiros desse passado?", interrogou.
O professor Manuel de Francesco, 71 anos, preferiu destacar o "cenário deslumbrante" da casa repleta de livros, fotografias, aguarelas, desenhos, móveis, colecções únicas de pintura "Era uma casa única. Cheguei a levar lá os meus alunos numa visita de estudo. Toda a gente ficou admirada e com vontade de voltar", sublinhou.
No passeio diante da casa a cair de podre, com vidros partidos e jardins abandonados, a professora Margarida Vilhena, não escondeu, ao JN, a "revolta e a mágoa" pelo facto da Câmara do Porto "ter deixado cair" uma casa com história "É uma dor de alma ver estas paredes destruídas e um espólio fechado à cidade", lembrou.Perante as críticas levantadas, o vereador da Cultura esclareceu que, "neste momento, os custos da obra ainda não estão totalmente apurados", mas a empreitada será feita através da empresa municipal DomusSocial.Enquanto a reabilitação não é iniciada, restou à cidade observar, até há pouco tempo, na Casa Tait, uma pequena exposição de alguns óleos do pintor subordinados ao tema "Paisagens".
domingo, 2 de março de 2008
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