Lições sobre o investimento em alta tecnologia
(Público) 03.02.2009, por Lurdes Ferreira
No debate quinzenal da semana passada, o primeiro-ministro reconheceu que a vontade do Governo poderia não bastar para salvar a Qimonda. "Eu só garanti a ajuda do Governo, não sei se isso é suficiente", disse José Sócrates aos deputados. É uma declaração significativa de quem, exercendo as funções de máxima responsabilidade no Governo, sempre apresentou a fábrica como um exemplo de sucesso, de futuro e de esperança, mesmo quando já não era possível não ver as dificuldades em que a Qimonda vivia.Se a declaração de Sócrates foi um pré-anúncio de um passo que ninguém quer anunciar, só o próprio poderá confirmar. O tom foi depois seguido por outros membros do Governo, até o presidente da Aicep, Basílio Horta, começar a falar na eventual devolução de ajudas. Chegados aqui, diz a lição da Renault de Setúbal e da Opel da Azambuja, pouco ou nada restará. A que já foi a maior exportadora nacional tem um problema que lhe vem da sua principal força: é uma companhia de elevado conteúdo tecnológico, emprega naquela unidade 1800 trabalhadores altamente qualificados, mas o negócio dos semicondutores dos europeus e norte-americanos atravessa uma crise estrutural há anos, por culpa da concorrência asiática, da China, Coreia e Taiwan, sobretudo. Tal como o PÚBLICO escreveu na edição de sexta-feira passada, foi essa situação que levou a Qimonda a tentar diversificar para novos negócios com o que foi visto como uma "fuga em frente", através da parceria com os alemães da Centrosolar para o investimento em células fotovoltaicas em Vila do Conde. Num sector cuja diferenciação se faz pelo baixo custo da mão-de-obra, a nova aposta da Qimonda vê ainda mais reduzidas as possibilidades de sucesso: a crise financeira fez adiar muitos projectos de energia e o mercado internacional tem produto em excesso, com os chineses sobretudo a tentar escoar produção a preços ainda mais baixos. E não há volta a dar ao cerne do problema - por mais produtiva que seja, a unidade portuguesa nunca conseguirá vender a preços chineses.O país está a descobrir que os investimentos em alta tecnologia e elevada qualificação, afinal, também não são seguros, apesar de os recursos humanos qualificados poderem sair mais depressa da crise. Ironicamente, descobre também como é mais fácil decidir-se o destino dos investimentos que limitam o seu valor acrescentado nacional à incorporação de mão-de-obra sem relação com uma cadeia de fornecedores. A Opel da Azambuja já tinha ensinado isso, a antiga Renaut de Setúbal também.
(Público) 03.02.2009, por Lurdes Ferreira
No debate quinzenal da semana passada, o primeiro-ministro reconheceu que a vontade do Governo poderia não bastar para salvar a Qimonda. "Eu só garanti a ajuda do Governo, não sei se isso é suficiente", disse José Sócrates aos deputados. É uma declaração significativa de quem, exercendo as funções de máxima responsabilidade no Governo, sempre apresentou a fábrica como um exemplo de sucesso, de futuro e de esperança, mesmo quando já não era possível não ver as dificuldades em que a Qimonda vivia.Se a declaração de Sócrates foi um pré-anúncio de um passo que ninguém quer anunciar, só o próprio poderá confirmar. O tom foi depois seguido por outros membros do Governo, até o presidente da Aicep, Basílio Horta, começar a falar na eventual devolução de ajudas. Chegados aqui, diz a lição da Renault de Setúbal e da Opel da Azambuja, pouco ou nada restará. A que já foi a maior exportadora nacional tem um problema que lhe vem da sua principal força: é uma companhia de elevado conteúdo tecnológico, emprega naquela unidade 1800 trabalhadores altamente qualificados, mas o negócio dos semicondutores dos europeus e norte-americanos atravessa uma crise estrutural há anos, por culpa da concorrência asiática, da China, Coreia e Taiwan, sobretudo. Tal como o PÚBLICO escreveu na edição de sexta-feira passada, foi essa situação que levou a Qimonda a tentar diversificar para novos negócios com o que foi visto como uma "fuga em frente", através da parceria com os alemães da Centrosolar para o investimento em células fotovoltaicas em Vila do Conde. Num sector cuja diferenciação se faz pelo baixo custo da mão-de-obra, a nova aposta da Qimonda vê ainda mais reduzidas as possibilidades de sucesso: a crise financeira fez adiar muitos projectos de energia e o mercado internacional tem produto em excesso, com os chineses sobretudo a tentar escoar produção a preços ainda mais baixos. E não há volta a dar ao cerne do problema - por mais produtiva que seja, a unidade portuguesa nunca conseguirá vender a preços chineses.O país está a descobrir que os investimentos em alta tecnologia e elevada qualificação, afinal, também não são seguros, apesar de os recursos humanos qualificados poderem sair mais depressa da crise. Ironicamente, descobre também como é mais fácil decidir-se o destino dos investimentos que limitam o seu valor acrescentado nacional à incorporação de mão-de-obra sem relação com uma cadeia de fornecedores. A Opel da Azambuja já tinha ensinado isso, a antiga Renaut de Setúbal também.
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