quinta-feira, 16 de abril de 2009

Metro não quer "guerra com a cidade"
Empresa admite enterrar a Linha do Campo Alegre, mas ainda tem esperança de convencer a Câmara a aceitar o traçado à superfície. Linha da Boavista descartada

16.4.2009 CARLA SOFIA LUZ e HUGO SILVA
O presidente da Metro afirma que a empresa não pode impor o traçado à superfície da Linha do Campo Alegre à cidade do Porto.
Embora reconheça vantagens à solução, Ricardo Fonseca admite que criará dificuldades em Diogo Botelho e não rejeita o enterramento em nome do consenso. Gostaria que tudo ficasse esclarecido até ao final do mês e deixa implícito que a Linha da Boavista foi abandonada.
JN: Foi surpreendido pelas sessões de esclarecimentos sobre a Linha do Campo Alegre, agendadas pela Câmara do Porto, antes da comissão ter finalizado o trabalho?
RF:Confesso que não estava a contar com estas sessões. Mas foi iniciativa deles e nada tenho a objectar. Admito que, como representantes da Autarquia, queiram ouvir o sentimento das populações. De qualquer modo, impõe-se que se diga que não deixaríamos de fazer este debate. Temos pedidas as declarações de impacto ambiental que têm uma fase de debate público. Nós iríamos prestar esses esclarecimentos às populações nas sessões de debate público que iriam ser promovidas. Pedimos declarações de impacto ambiental para todas as linhas da segunda fase de expansão da rede. O debate público irá existir sempre.
JN:Acha que estas sessões são um debate público para apresentar as vantagens e as desvantagens dos traçados ou é só direccionado para a defesa do enterramento?
RF:Pelas notícias que tenho lido, acho que o debate está mais direccionado para a defesa de um tipo de solução, mas é vida...
JN:O Município informou a Metro que ia realizar estes debates?
RF:Informaram os nossos representantes na comissão e explicaram que queriam ouvir as populações.
JN:Como vê as críticas das juntas de freguesia e da Câmara ao traçado?
RF:Não é segredo que a Metro defende que a solução à superfície é a ideal, sempre que possível. É mais amigável para os clientes e torna muito mais fácil o acesso ao metro, além de ser mais barata. Neste troço entre Diogo Botelho e Campo Alegre, admitimos alguma dificuldade em manter o metro à superfície. Não é impossível, caso contrário não tínhamos apresentado uma proposta nesse sentido. Reconhecemos que é difícil e aguardamos que se chegue a um consenso. Repare, na segunda fase de expansão, estamos a acrescentar cerca de 45 quilómetros à rede. A discussão centra-se só em dois quilómetros, porque, em todos os outros traçados, temos trabalhado com as autarquias e tem sido pacífico. Espero que acabe por ser pacífica também a solução para o Campo Alegre.
JN:Nos debates, os representantes da Câmara têm afirmado que os custos são semelhantes da linha enterrada ou à superfície...
RF:Não. Se for uma solução cut and cover, a diferença é de cerca de oito milhões por quilómetro.
JN:A opção pelo enterramento pode atrasar a execução da linha?
RF:Não. É só definirmos se o projecto de execução será à superfície ou enterrado.
JN:As críticas são prematuras?
RF:Diria que se assiste a um primeiro debate. Há defensores de uma solução e há defensores de outra. Estou convencido que, muito rapidamente, vamos chegar a uma posição consensual.
JN:Tendo em conta que a Metro defende uma linha à superfície e que a Câmara manifesta, de forma tão vincada, a opção pelo enterramento, como é que será possível obter esse consenso?
RF:Acusem-nos de tudo, menos de sermos excessivamente teimosos. Se concluirmos que a forma de não inviabilizar a linha será a solução cut an cover, admito que possa avançar-se por esse caminho.
JN:Há, então, abertura da parte da Metro para enterrar a linha?
RF:Não faria sentido discutirmos se não estivéssemos dispostos a analisar prós e contras e a tomar uma decisão em função daquilo que for mais consensual e melhor para a cidade. Não queremos criar uma guerra com a cidade.
JN:Teria de fazer um estudo novo. Isso não acarreta atrasos?
RF:Ainda só temos um estudo prévio. Este é efectivamente o momento para discutir-se, porque o projecto de execução ainda não começou a ser feito. Quando for desenvolvido, já tem de estar clara qual é a nossa opção.
JN:A CDU/Porto acusou Rui Rio de criar esta polémica para tirar dividendos políticos. Concorda? RF:Quando coloca assim a questão, prefiro não comentar. A Metro apresentou uma proposta e quer que a segunda fase avance o mais rápida e pacificamente possível.
JN:A Linha da Boavista foi abandonada?
RF:Só se tem falado na Linha do Campo Alegre, daí tirem as vossas ilações.
JN:Para quando uma decisão sobre a Linha do Campo Alegre?
RF:Espero que seja o mais rapidamente possível. Já devia ter sido tomada. Precisamos de avançar com os projectos de execução.
JN:Existe algum prazo limite?
RF:Gostaria que tudo ficasse esclarecido durante este mês.
JN:Se o consenso desejado não for possível, como é que a Administração da Metro decidirá perante um relatório a duas vozes?
RF:É um cenário que, à partida, tenho de excluir. Não estou a ver como é que uma empresa pode impor uma solução à Câmara. Temos forçosamente que chegar a uma posição consensual.
JN:A Metro ainda tem a expectativa de convencer a Câmara sobre as vantagens da linha à superfície?
RF:Ainda temos alguma esperança, mas tem vindo a ser diminuída sem dúvida alguma.
JN:Poderia manter-se, por exemplo, a linha à superfície na Via Nun'Álvares e enterrar o percurso restante?
RF:Não quero estar a antecipar-me às conclusões da comissão. Mas não veria com bons olhos, numa avenida relativamente pequena, uma trincheira à entrada e outra à saída. Não faz sentido. A ser enterrada, seria em todo o percurso.
JN:A Linha da Boavista já previa um viaduto no Parque da Cidade. A análise técnica da Câmara à Linha do Campo Alegre aponta o dedo à existência de um novo viaduto. Acha que pode enterrar-se a linha no parque ou não faz sentido?
RF:Uma coisa de cada vez. Nesta altura, estamos a pensar no Campo Alegre, na Via Nun' Álvares e na Diogo Botelho. O Parque da Cidade será também objecto de uma análise. Acho provável que a solução tenha que ser repensada.
JN:Não concorda com outro viaduto?
RF:É um assunto que está a ser tratado na comissão. Seria deselegante da minha parte, embora saiba o que está a ser tratado na comissão, estar a adiantar um trabalho que deve ser conjunto. Estou convencido de que vai ser muito fácil arranjarmos uma posição consensual relativamente à travessia do Parque da Cidade.
JN:A Metro vai reclamar o dinheiro investido na Avenida da Boavista à Câmara do Porto?
RF:Isso são contas para acertar no futuro. Existe um débito, mas ainda é prematuro falar de como vai ser resolvida a situação.
JN:A Câmara já tem consciência que a Linha da Boavista não avança?
RF:Não temos falado sobre a Linha da Boavista. Temos falado só sobre a Linha do Campo Alegre. JN:Como estão os processos das outras linhas da segunda fase?
RF:A segunda fase tem 45 quilómetros e, em 43 quilómetros, tem sido tudo completamente pacífico. O diálogo entre as autarquias e a Metro do Porto tem decorrido da melhor maneira, tanto nas duas linhas principais, a de Gaia e a de S. Mamede de Infesta, como na ligação entre Campanhã e Gondomar. Tem havido reuniões regulares e não há polémica.
JN:Em que fase é que estão?
RF:Foi pedida a declaração de impacto ambiental e aguardamos os respectivos procedimentos.
JN:Os traçados são os conhecidos ou foram introduzidas alterações?
RF:Foi necessário fazer pequenos ajustes aos traçados propostos a 1 de Outubro, em função do diálogo entre a Metro e as autarquias.
JN:Em Gaia, sabemos que o traçado é maioritariamente à superfície até ao hospital. Em Matosinhos, como vai ser o traçado da segunda linha, que servirá S. Mamede?
RF:É um misto. Parte enterrada, usando o sistema cut and cover [escavação sem recurso à tuneladora], e parte à superfície. Só é enterrado quando não é possível fazer à superfície. Há um consenso total.
JN:A zona enterrada é no Porto?
RF:A zona mais complexa dessa linha é a envolvente ao Hospital de S. João, onde será enterrada. JN:Quanto à linha por Valbom, que soluções estão pensadas para ultrapassar o vale de Campanhã?
RF:O vale será ultrapassado por viaduto. Vai ter uma parte enterrada relativamente pequena, mas o grosso da linha será em viaduto. Essa linha há-de ter, numa terceira fase, ligação à circular interna em Campanhã.
JN:Ainda é possível lançar o concurso de concepção e de construção das linhas da segunda fase até Setembro, como estava previsto?
RF:Ainda não desistimos. Temos Setembro/Outubro como objectivo.
JN:É inevitável a Metro viver numa espécie de sufoco financeiro?
RF:Inevitável? Efectivamente é uma situação financeira difícil, mas com certeza será superada. Estamos a viver uma situação preocupante, mas não é um drama.
JN:É certo que gostariam de receber mais apoio a fundo perdido do Estado...
RF:Sem dúvida. A Metro do Porto tem já um investimento total superior a 2200 milhões de euros. Era suposto, para este projecto, receber um financiamento a fundo perdido na ordem dos 43%, mas, na verdade, o financiamento a fundo perdido é de cerca de 23%. Isto reflecte-se, naturalmente, na situação financeira da empresa. Por alguma razão, só os encargos financeiros em 2008 atingiram cerca de 67 milhões de euros. Tem de haver, forçosamente, uma solução para esta situação financeira da Metro do Porto.
JN:Já tiveram alguma indicação da tutela de que estaria para breve essa solução?
RF:Por enquanto ainda não, mas com certeza que não vai ser por falta de financiamento que a Metro deixará de executar o projecto de desenvolvimento que tem.
JN:Quais as medidas que estão a ser implementadas para ultrapassar esta situação? O Relatório e Contas da empresa do ano passado indica uma falência técnica...
RF:Como muitas empresas, infelizmente. Antes fôssemos um caso isolado, mas não somos. Nesta altura, ainda nada tenho a dizer sobre essa matéria.
JN:Se esta situação difícil se mantiver, poderá ter reflexos na operação?
RF:Não. Ainda temos possibilidade de, através de financiamentos intercalares, ir superando as dificuldades financeiras da empresa. Não é o caminho correcto, mas, se não houver outro, é o caminho que trilharemos.
JN:Esta situação financeira da empresa pode inviabilizar a construção de novas linhas?
RF:Não. A segunda fase do desenvolvimento da rede do metro vai ser uma sub-concessão.
JN:E poderá ser essa também a solução para a terceira fase.
RF:É muito cedo para falarmos ainda na terceira fase. Estamos a falar para daqui a 15 anos. Falemos na segunda, pois já há muito para falar. É um investimento superior a 1200 milhões de euros.
JN:Por que razão foi lançado um concurso para a exploração da rede do metro com um prazo de apenas cinco anos?
RF:Temos a ideia exacta de qual vai ser a rede a explorar nos próximos cinco anos. No entanto, para um horizonte superior, levanta-se uma série de indefinições, nomeadamente de calendarização e de execução das linhas. Por isso, nós estendemos o concurso da exploração até ao horizonte temporal em que temos a certeza de qual vai ser a rede em operação. E isto porque agora, nos concurso que lançamos, temos que previamente fixar o preço máximo. Como só temos a certeza de qual vai ser a rede a explorar nos próximos cinco anos, não podíamos ir além. Seria um risco muito grande.
JN:Quando foi apresentado o plano de expansão da rede a 1 de Outubro do ano passado, havia a intenção de não fazer várias obras em simultâneo e construir apenas uma linha de cada vez. Mantém-se esse princípio?
RF:Neste horizonte de cinco anos, temos a extensão a Vila d'Este, em Gaia, a Linha de Gondomar, que está já a ser construída, a linha da zona Ocidental do Porto e a extensão à Trofa. É este conjunto que será desenvolvido, em princípio, nos próximos cinco anos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Uma bela entrevista de Ricardo da Fonseca que mostra muito mais sentido político que o chefe do PS Porto ou a candidata à Câmara que não diz nada