O pântano institucional
(JN) 23.9.09
O presidente da República transformou-se numa das figuras centrais da campanha eleitoral em curso. Os esforços, assumidos pelo próprio, de se manter à margem da luta partidária caíram ontem por terra, com a exoneração do seu assessor principal e companheiro político de mais de duas décadas, Fernando Lima. Ao deixar cair o jornalista, Cavaco Silva assume que algo de muito grave se passou no intitulado "caso das escutas". Independentemente das circunstâncias (talvez nunca as venhamos a conhecer na totalidade) que conduziram a este desfecho, o chefe de Estado sai deste (ainda inacabado) episódio com a sua imagem bastante fragilizada.
Porquê? Porque uma de duas: ou Cavaco foi enganado pelo seu ex-assessor, o que é grave (e um pouco inverosímil); ou não foi enganado e geriu pessimamente o caso, o que é ainda mais grave. Aliás, se a segunda possibilidade fosse a correcta, estaríamos perante um jogo de tal forma ínvio que a hipótese de se avançar para um impugnação do mandato do presidente da República não seria, a meu ver, uma mera hipótese académica.
Em qualquer país com boa tradição democrática este caso seria investigado até ao limite. E daí retiradas as devidas consequências. Em Portugal, a excessiva reverência com que habitualmente são tratados os detentores do poder (primeiro-ministro e presidentes da República antes de todos os demais) servem de travão ao aprofundamento de responsabilidades.
Os factos são o que são. Quando foi pela primeira vez confrontado com a manchete do DN que dava conta de ter sido Fernando Lima a colocar no jornal "Público" o "caso das escutas", o chefe de Estado respondeu: depois das eleições, trataria de saber em que estado se encontra a segurança do país. Isto é: Cavaco deu imediata cobertura à tese dos que achavam que a "conspiração" envolvia escutas, espionagem e entusiasmantes coisas afins. Ao fazê-lo - e sobretudo ao dizer que não acreditava que a urdidura partisse de Belém -, o presidente da República defendeu o seu ex-assessor.
O que mudou no curto espaço de uma semana? O chefe de Estado concluiu que Lima actuou à sua revelia? Lima não lhe mentiu, mas o chefe de Estado entendeu que o nome do presidente passou a estar em causa e viu-se na iminência de sacrificar alguém? Cavaco sacrificou um inocente? Por que razão disse que só falaria depois das eleições e, afinal, actuou antes? Por que não "matou" o assunto à nascença? Ao não fazê-lo, permitiu a ilação mais grave de todas: tudo parece ter sido feito à medida para incomodar o Governo.
Eis-nos no pântano institucional a poucos dias das legislativas. O senhor presidente devia dizer-nos como sair daqui.
(JN) 23.9.09
O presidente da República transformou-se numa das figuras centrais da campanha eleitoral em curso. Os esforços, assumidos pelo próprio, de se manter à margem da luta partidária caíram ontem por terra, com a exoneração do seu assessor principal e companheiro político de mais de duas décadas, Fernando Lima. Ao deixar cair o jornalista, Cavaco Silva assume que algo de muito grave se passou no intitulado "caso das escutas". Independentemente das circunstâncias (talvez nunca as venhamos a conhecer na totalidade) que conduziram a este desfecho, o chefe de Estado sai deste (ainda inacabado) episódio com a sua imagem bastante fragilizada.
Porquê? Porque uma de duas: ou Cavaco foi enganado pelo seu ex-assessor, o que é grave (e um pouco inverosímil); ou não foi enganado e geriu pessimamente o caso, o que é ainda mais grave. Aliás, se a segunda possibilidade fosse a correcta, estaríamos perante um jogo de tal forma ínvio que a hipótese de se avançar para um impugnação do mandato do presidente da República não seria, a meu ver, uma mera hipótese académica.
Em qualquer país com boa tradição democrática este caso seria investigado até ao limite. E daí retiradas as devidas consequências. Em Portugal, a excessiva reverência com que habitualmente são tratados os detentores do poder (primeiro-ministro e presidentes da República antes de todos os demais) servem de travão ao aprofundamento de responsabilidades.
Os factos são o que são. Quando foi pela primeira vez confrontado com a manchete do DN que dava conta de ter sido Fernando Lima a colocar no jornal "Público" o "caso das escutas", o chefe de Estado respondeu: depois das eleições, trataria de saber em que estado se encontra a segurança do país. Isto é: Cavaco deu imediata cobertura à tese dos que achavam que a "conspiração" envolvia escutas, espionagem e entusiasmantes coisas afins. Ao fazê-lo - e sobretudo ao dizer que não acreditava que a urdidura partisse de Belém -, o presidente da República defendeu o seu ex-assessor.
O que mudou no curto espaço de uma semana? O chefe de Estado concluiu que Lima actuou à sua revelia? Lima não lhe mentiu, mas o chefe de Estado entendeu que o nome do presidente passou a estar em causa e viu-se na iminência de sacrificar alguém? Cavaco sacrificou um inocente? Por que razão disse que só falaria depois das eleições e, afinal, actuou antes? Por que não "matou" o assunto à nascença? Ao não fazê-lo, permitiu a ilação mais grave de todas: tudo parece ter sido feito à medida para incomodar o Governo.
Eis-nos no pântano institucional a poucos dias das legislativas. O senhor presidente devia dizer-nos como sair daqui.
Sem comentários:
Enviar um comentário