segunda-feira, 15 de setembro de 2008

(Público) 15.09.2008 Entrevista de Abel Coentrão e Carla Marques (Rádio Nova)

Elisa Ferreira ou Nuno Cardoso para a Câmara do Porto?
Pedro Baptista considera que o ex-presidente Nuno Cardoso seria, como Elisa Ferreira, um bom candidato à Câmara do Porto. "Vá lá saber-se qual seria o melhor. O candidato será aquele que a concelhia do Porto indicar", assinalou o candidato do PS-Porto.


Sem papas na língua, Pedro Baptista promete um PS inconformado com os problemas da região. O país precisa de líderes politicamente incorrectos, garante

Aos 60 anos, Pedro Baptista, militante do PS e ex-deputado à Assembleia da República, propõe-se disputar a liderança da Federação Distrital do Porto do PS, actualmente nas mãos de Renato Sampaio, que se recandidata ao cargo. Nesta entrevista, que pode ser ouvida na íntegra em www.radionova.fm, o actual líder é acusado de nunca ter levantado a voz para defender o Porto e o Norte.
P:Pedro Baptista, num partido no poder, como o PS, há espaço para líderes politicamente incorrectos?
Eu diria que tem que haver. Num partido que tem como tarefa prioritária ser governo tem que haver uma dinâmica plural no seu interior, troca de ideias entre o Governo e as bases e vice-versa. Este país e a Europa em geral andam a precisar muito de líderes e pessoas politicamente incorrectas, porque o politicamente correcto até já é uma expressão pejorativa que significa ortodoxia, repetição, inutilidade, nulidade intelectual. É preciso pessoas que pensem pela sua cabeça, que combatam a tendência para o pensamento único, que se assumam pela sua consciência e, aqui tocamos no ponto, que não se deixem levar pelas hordas de carreiristas que procuram lugares e ser benquistos pelos chefes, à custa de não pensarem, de serem subservientes e baterem palmas.
P:Mas o que é que lhe tem desagradado mais na actuação do PS no Porto? É isso que está a referir?
Eu até estava a fazer o retrato no mundo com que rompi logo na minha infância, o da União Nacional. O Partido Socialista é um partido democrata, é um esteio da democracia portuguesa. E não só é como tem que ser...
P:E tem sido?
Ora aí está a questão. Tem sido, mas pode deixar de o ser. Em numerosos momentos da vida do PS parece que estamos na União Nacional. Quando se desenvolve unanimismo, quando se considera o silêncio um capital...
P:Mas acredita ter alguma hipótese de vencer uma candidatura com uma rede de apoios estabelecida, como a de Renato Sampaio? Vai mesmo apresentar-se a votos?
Sem dúvida nenhuma. Não há razão nenhuma para não ir até ao fim. Até porque nem é verdade que haja uma discrepância de apoios. O meu adversário terá reunido no sábado mil pessoas num almoço--comício. Mas há 16 mil militantes no distrito. E eu gostaria de saber quantas pessoas estiveram no sábado no pavilhão do Académico por querer, e quantas por ter de estar. Centenas daquelas pessoas são os nomeados políticos, são também os candidatos indicados pelos directórios. Pessoas que estão lá para não deixarem de ser nomeadas ou indicadas nas próximas eleições para as autarquias e para a Assembleia da República. Depois, os eleitores votam num processo que já está manipulado a montante, porque as listas apresentadas ao eleitorado não são aquelas em que o eleitorado gostaria de votar.
P:Com o Pedro Baptista na liderança do PS Porto, o que é que mudaria? A lista de deputados?
Eu entendo que eles deviam ser escolhidos internamente a nível concelhio, numa relação proporcional de acordo com o eleitorado de cada concelho. Deve haver uma espécie de primárias internas. E digo internas porque não posso prometer outra coisa pela qual vou lutar: uma eleição à americana, aberta a todos os cidadãos. Defendo que os deputados deixem de ser nomeados secretamente por uma ou duas pessoas, em resultado dos acordos mais espúrios do tipo "apoia-me, se não já sabes como é!". Às vezes nem é preciso dizê-lo.
P:Pode dar exemplos?
Não falo de casos concretos, mas dos vinte deputados do Porto, os dois ou três que tiveram atitudes críticas durante os primeiros anos do mandato já se calaram. E nenhum deles me vai apoiar. Também há outra razão. É verdade que eu já disse que, por mim, corro com eles todos. Admito que haja um ou dois, mas, que eu tenha conhecimento, não há nenhum deputado eleito pelo Porto que se tenha portado à altura dos seus eleitores.
P:Em que outras matérias faria diferente?
O presidente da federação não levantou a voz em relação a um único dossier: quando tomaram a iniciativa sobre o desemprego, foi a reboque de outro partido. Em relação ao desvio de dezenas de milhões de euros dos programas temáticos do QREN [Quadro de Referência Estratégico Nacional] para Lisboa, nem uma palavra. Depois há a desigualdade de investimentos em Lisboa e no Porto. Posso-lhe falar de sete ou oito temas. Veja a questão das Scuts por exemplo. As concelhias da Póvoa, de Vila do Conde e de Matosinhos tomaram posição contra as portagens, e o presidente da federação nunca o fez. Eu encontrei aqui no Porto o meu amigo Mário Lino, ministro das Obras Públicas, e disse-lhe de caras: "Vais arranjar aqui uma nova Maria da Fonte". A verdade é que as portagens ainda não foram para a frente. Se forem aplicadas, eu vou estar com o povo, porque entre a fidelidade ao partido e a fidelidade às pessoas, à região, às minhas ideias, eu não tenho dúvidas. Não tem nenhum sentido escolher para colocar portagens uma região com dificuldades económicas, e deixar de lado até a Via do Infante.
P:Como pode impedir isso?
Quando for presidente da federação, vou falar directamente com o Governo. Levanto a voz se não me ouvirem, o que não acredito. Acredito que, quando eu for presidente da federação, José Sócrates vai governar melhor do que agora, que tem uma pessoa só para lhe dizer que sim. Ele é suficientemente inteligente para perceber isso. Isto não é novidade nenhuma. O Porto, há uma dúzia de anos, era assim. Falava por uma pessoa que era mais fleumática que eu - e oxalá ele estivesse no lugar em que eu quero estar, com a vitalidade que tinha na altura. Com Fernando Gomes nunca se atreveriam a fazer este tipo de coisas ao Porto. Veja o caso do metro. Como é possível a centralização da Metro do Porto? E não houve um deputado do PS que levantasse a voz... O presidente da federação não defendeu o Porto, quando temos derrapagens no metro em Lisboa.
P:Nos partidos do poder, o PSD fica com o exclusivo da crítica...
Lamento é que só façam isso quando estão na oposição. Um defeito do PS, também. Os cidadãos não podem aceitar que a região seja utilizada como um joguete. Só há bandeiras regionais quando se está na oposição, e quando se está no poder vende-se esse crédito por uma subida no poder central. Tem sido esta a nossa história nos últimos vinte anos, no PS e no PSD. E é preciso romper com este estado de coisas.
P:De que forma?
Sou defensor de pactos regionais no sentido da defesa da Região Norte.
P:Mas o PS parece estar a dar a Rui Rio o exclusivo do debate sobre a regionalização, no Norte...
O trabalho preparatório para criar as condições para a regionalização nas comissões de coordenação regional tem sido, pelo que sei, muito deficiente. E tenho uma interrogação. Em 2009 teremos que fazer da regionalização uma bandeira eleitoral, e confesso que acho que não vai ser fácil. Há um pensamento adverso à regionalização por parte de grupos centralistas.


Elisa não pode ser candidata às Europeias

P:O que tem a dizer sobre a forma como tem sido gerida a eventual candidatura de Elisa Ferreira no Porto?
A minha amiga Elisa Ferreira será, para mim, do melhor, como presidente da Câmara do Porto. Mas a forma como está a ser conduzido o processo da sua eventual candidatura é a pior possível. Está a transformar a melhor possível presidente da Câmara do Porto numa candidata com dificuldades. E a culpa é de uma única pessoa, do presidente da federação, que, para se exibir, a trouxe nas piores condições [um comício do Governo, no pavilhão do Académico], num contexto em que a classe média portuense, que é perspicaz, notou que, sendo de cá, ela estava a ser trazida de Lisboa. E depois há outra questão: não tem sentido que em Junho ela seja candidata ao Parlamento Europeu e em Novembro concorra à autarquia. Mesmo que se diga que, ganhando a segunda, abdica do primeiro cargo. Ficará sempre a ideia de que a candidatura ao Parlamento Europeu foi pouco séria, porque afinal havia a ideia de sair uns meses depois. E por outro lado, politicamente, dar-se-á um sinal ao eleitorado do Porto de pouca confiança na vitória nas autárquicas.
P:E é possível ganhar a Rui Rio?
O candidato ao Porto, para derrotar Rui Rio, tem de emergir do próprio Porto. E é por isso que eu, ao mesmo tempo, defendo as coligações à esquerda.
P:Se o PS não ganhar o Porto, perde as autárquicas no distrito?
Claro!
P:E como resolveria as questões complicadas que se colocam ao PS noutros concelhos, como Matosinhos, por exemplo?
Se o PS perder mais câmaras no distrito, será muito por culpa do actual presidente da federação. No caso de Matosinhos, passados estes três anos, nunca tomou nenhuma atitude para resolver o problema.
P:Como resolveria o caso da eventual candidatura de Narciso como independente?
Eu respeito as decisões das concelhias, mas entendo que elas têm que ter em conta o ponto de vista do eleitorado socialista. Se uma sondagem mandada fazer por mim der um resultado claríssimo a favor de um deles, trabalharei intensamente para o outro sair.
P:Mesmo que tivesse de ser Guilherme Pinto a sair?
Claro. A situação é muito sui generis. O Narciso não foi irradiado. Está a ser perseguido pelo presidente da federação sem razão nenhuma.

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