(DN) 28.05.2008 Causou incomodidade no Governo e no PS o artigo de ontem, no DN, onde Mário Soares aconselhou o PS a fazer uma "reflexão profunda as questões que nos afligem mais: a pobreza, as desigualdades sociais, o descontentamento das classes médias".
José Sócrates deu sinal dessa incomodidade evitando responder a jornalistas, em Angra do Heroísmo, na sessão de encerramento das jornadas parlamentares do PS. "Hoje não faço declarações", disse, seguindo logo para o púlpito, onde falou aos deputados do "momento de dificuldade"que Portugal atravessa, relativizando-o num contexto internacional: "É um momento de dificuldade que Portugal enfrenta, que todos os países da Europa enfrentam." Amanhã Sócrates voltará a ser fustigado com os avisos do "pai fundador" do PS, em mais um debate na Assembleia da República. Ontem ensaiou alguns argumentos, usando a técnica, habitual, de culpar o passado, com referências à "situação social muito desequilibrada" herdada dos governos de Durão e Santana.
Quem não escondeu o desgaste foi Mário Lino. Falando no Porto, à margem da inauguração de uma nova linha do metro, o ministro das Obras Públicas desafabou: "O PS e o Governo não estão a dormir e à espera que Mário Soares faça um aviso para de repente dar conta do problema."Logo a seguir tentou suavizar: "Os avisos são importantes porque demonstra que essa sensibilidade é muito forte dentro do PS. É bom que assim seja e o dr. Mário Soares é o exemplo de uma pessoa que sempre esteve atenta a esse tipo de problemas. A sociedade é muito vasta e tem muitos problemas para os quais temos de olhar e dar conta."Por outras palavras: "Estou de acordo com Mário Soares, que é preciso que, nesta altura, um Governo com as características do PS seja muito sensível às questões da pobreza e àquilo que são as necessidades das pessoas com maiores dificuldades. Isso é absolutamente óbvio.
"Depois das declarações de Lino, o ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira, também ele participando, nos Açores, nas jornadas parlamentares do PS, iniciou a tradicional operação de controlo de danos. A operação consiste sempre no mesmo: se não o vences, junta-te a ele. "Mário Soares tem toda a razão. É preciso dar uma atenção especial aos mais desfavorecidos", disse o ministro aos jornalistas. Trata-se, acrescentou, de uma "mensagem convergente com as preocupações do PS". "É uma preocupação de sempre do PS. O PS sempre deu atenção ao combate à pobreza e tem uma atenção redobrada neste momento", acrescentou, ao mesmo tempo que sublinhava algumas medidas, como o aumento do abono de família para os agregados mais desfavorecidos ou o congelamento até ao final do ano do preço do passe social.
Depois, no encerramento na reunião, Sócrates acrescentaria que "é justamente nos momentos de dificuldade que é preciso mais firmeza no rumo". Recusou por isso ceder "à facilidade ou à demagogia", isto apesar da sua "total compreensão" com os que sofrem mais os problemas decorrentes da alta do preço do petróleo. Agora, avisou, "o dever do Governo é utilizar a margem de manobra que consegue para ajudar os sectores mais frágeis".Sócrates aproveitou ainda a oportunidade para começar já a combater teses que, no PSD, vão ganhando espaço, como o fim do carácter universal do Serviço Nacional de Saúde (o que Manuela Ferreira Leite e Passos Coelho defendem). "Queremos um SNS que sirva todos por igual, que todos tenham acesso ao mesmo.
"Igualmente posta de parte está, no entender do PS, a privatização de parte da Segurança Social, também defendida no PSD. "Querem um regime social obrigatório privado, criar um limite a partir do qual as contribuições sejam entregues para os caprichos da bolsa", criticou, insistindo na necessidade de uma "segurança social pública, mas eficiente, ao serviço da igualdade.
Ainda no artigo no DN, Soares avisou - e dizendo "quem vos avisa vosso amigo é" - para a possibilidade de o PS perder votos à esquerda se o Governo não conseguir a "resolução destas questões essenciais, que tanto afectam a maioria dos portugueses". "Se o não fizerem, o PCP e o BE - e os seus lideres - continuarão a subir nas sondagens. Inevitavelmente. É o voto de protesto, que tanta falta fará ao PS em tempo de eleições. "Também face a esta constatação - que aliás peritos em sondagens já reconheceram como sendo uma tendência "para ficar" - a técnica da cúpula socialista foi não alimentar controvérsias: Vitalino Canas, porta-voz do PS, reconheceu: "Estamos cientes dessa dificuldade que existe, da possibilidade de deslocação de votos para um certo sector."
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